sexta-feira, 30 de novembro de 2007

A propósito de Leonard Bernstein

Num dos seus comentários a um dos meus últimos posts, o meu caro amigo Fernando, autor do belíssimo blog "Diz que não gosta de música clássica" evocou muito justamente Leonard Bernstein, esse extraordinário maestro, director de orquestra e compositor, mas também comunicador e divulgador de música.
Na sequência do seu comentário lembrou essa série de programas "Concertos para jovens" sobre a qual me faltam adjectivos para qualificar. Fiquei marcado por esse programa, assim como programas de outros divulgadores de mérito como António Vitorino de Almeida, para além de outros maestros que tive a felicidade de ver actuar ao vivo e que fizeram mais pela cultura musical do nosso país do que os últimos 20 anos de televisão pública !!!
Voltarei sempre a Bernstein, porque vale sempre a pena explorar uma ou outra faceta do seu génio.
Por essa razão lembrei-me de recomendar a leitura de um livro que comprei ao acaso numa qualquer FNAC e cuja leitura me apaixonou desde a primeira página. Desde então esse livro tem passado de mão em mão pelos meus amigos mas do qual tenho guardado com zelo registos escrupulosamente detalhados do seu paradeiro e, graças ao meu cuidado, tem regressado sempre para as minhas mãos.
Falo naturalmente do "The joy of music" do qual existe a tradução portuguesa da editora "Livros do Brasil".

Este livro atravessa vários séculos de história da música, desde Bach a música do séc. XX, percorrendo vários géneros como a ópera, música sacra e sinfónica. Dedica também um capítulo ao Jazz, ao "musical" Norte-Americano e à técnica de direcção de orquestra. Tudo isto com uma simplicidade desarmante estimulando no leitor um desejo irreprimível de ouvir e conhecer mais desse maravilhoso mundo da música.

No seguinte excerto, Bernstein disserta sobre o seu próprio processo de divulgação da música a leigos:

"É por estar tão certo do que afirmo que me tornei ousado, ao ponto de falar sobre música na televisão, em discos e em conferências públicas. Sempre que tenho a sensação de que o fiz com êxito, penso que isto acontece porque, possivelmente, encontrei esse processo ideal. E é difícil chegar a esta conclusão se não tivermos a convicção de que o público não é um monstro, mas sim um organismo inteligente, na maioria das vezes ansioso por ser esclarecido e instruído. Assim, sempre que me é possível, tento falar de música - das notas da música; e, sempre que são necessárias ideias extramusicais, com a finalidade de referência ou esclarecimento, tento escolher conceitos que sejam musicalmente aplicáveis como, por exemplo, tendências nacionalistas ou de evolução espiritual, que possam mesmo ter feito parte do pensamento do próprio compositor. Assim, ao explicar o Jazz, tenho evitado as habituais divagações pseudo-históricas (rio-acima-desde-Nova-Orleães) e procurado concentrar-me naqueles aspectos de melodia, harmonia, ritmo, etc, que tornam o Jazz diferente de toda a outra música. Ao falar de Bach, senti a necessidade de me referir às suas convicções religiosas e espirituais mas, sempre, em função das notas musicais que escreveu. Ao tentar explicar o problema da escolha que todo o compositor tem que enfrentar, recorri aos esboços rejeitados do primeiro andamento da Quinta Sinfonia de Beethoven. Por outras palavras, a apreciação musical não é necessariamente um "negócio". Este tipo de referências extramusicais pode ser útil, quando posta ao serviço da explicação da própria música, e o sistema do "mapa de estradas" pode ser igualmente aceitável, se funcionar em relação a uma ideia central susceptível de captar a inteligência do ouvinte. é aí que se encontra o processo ideal, o qual, humildemente, espero ter conseguido alcançar nas páginas que se seguem."

Leonard Bernstein; "O Mundo da Música - Os seus segredos e a sua beleza"; vol 32 da colecção Vida e Cultura de editora Livros do Brasil.

Um comentário:

  1. Não me importo de confessar publicamente que já me aconteceu chorar a ouvir esses programas.

    Há comunicadores que nos fazem sentir e entender coisas sem por vezes sequer falar delas. É inexplicável.

    É justo referir Vitorino de Almeida que também está para mim nessa categoria "especial", tal como por exemplo Vitorino Nemésio. Lembro de ter 6/7 anos não mais do que isso e sentar-me na sala com o meu avô a ouvir o seu programa ... Se bem me lembro. Entendia pouco do que ele dizia claro, mas não sei se o tom de voz, a emoção que transmitia nas palavras faziam-me ficar colado ao ecrã a preto e branco e muitas vezes cheio de chuva ... Se bem me lembro ... o programa infelizmente não segue dentro de momentos e pelo menos que eu saiba não há edições em video nem de Vitorino de Almeida nem de Vitorino Nemésio. Um autêntico desperdicio ... Obrigado pelo elogio.

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